Anteriormente, já escrevi um artigo há alguns anos sobre um tema parecido,“Dentista é metido a Ursulão”, tratando da engenhosidade dos cirurgiões dentistas na hora utilizar materiais dentários para realizar pequenos reparos no dia a dia. O dentista brasileiro é extremamente criativo. Você pode se deparar com inúmeras “técnicas paralelas” para confecção de provisórios, peças sobre implantes, moldagem ou conserto de próteses móveis, por exemplo, onde o dentista precisou se virar com o que ele tem disponível para devolver o sorriso ao seu paciente. Técnicas que não estão em nenhum livro, artigo ou estudo, mas certamente funcionam. Isso não quer dizer que precisamos viver fazendo gambiarras.
MacGyver ou Professor Pardal?
Evidentemente, todos se lembram do MacGyver e do Professor Pardal, não é? O primeiro era capaz de fazer uma bomba com objetos comuns largados no bolso da calça como um clipe, um chiclete e um remédio para resfriado. O segundo é um personagem da Disney, da turma do Pato Donald e apesar das boas intenções, suas invenções (gambiarras) quase nunca funcionavam da maneira que se esperava. Seja por estar em uma área afastada dos grandes centros ou por falta de algum material específico, dentistas conseguem muitas vezes resolver problemas provisoriamente imitando as habilidades desses dois clássicos personagens.
Gambiarras devem ser exceções
Realizar pino provisório com clipe, por exemplo, suturar com fio dental utilizando uma Pinça Kelly, afastar tecidos com o Descolador de Molt, cobrir bolhas da moldagem com Lisanda com outra camada do material e realizar uma segunda moldagem por cima, utilizar a broca 1090 para todo e qualquer desgaste, inserir resina na cavidade com brunidor de amálgama, remover cárie com alta rotação, extrair raiz residual fazendo alavanca com Cureta de Lucas são alguns exemplos. Tenho certeza que nenhum professor de faculdade ensinou isso. Entretanto, essas exceções às técnicas clássicas não podem virar regra.
Confesso que o dentista sofre bastante quando é um recém formado. Principalmente, se ele for trabalhar em consultórios de terceiros, em regiões menos abastadas. Muitas vezes a falta de materiais e a desorganização do estoque faz com que os pacientes precisem ser atendidos e a criatividade aflora nas resoluções de problemas. É claro que é melhor fazer um dente provisório utilizando um clipe do que deixar o paciente sem dente, em um caso estremo de urgência. Todavia, tornar regra dentro do seu consultório que provisórios serão feitos com clipes e deixar uma penca deles em um nicho dentro da gaveta não é bacana.
Muitos profissionais são frutos de seus meios. Professores sempre alertam sobre isso: comece trabalhado errado, siga a vida fazendo as coisas erradas. A gente precisa virar a chave e abrir caminho para a evolução.
Em primeiro lugar, o dentista não pode ser desonesto com o paciente, como já ouvi em relatos como esse: “Não tinha filme de radiografia periapical na clínica, então o dentista simulava uma tomada radiográfica sobre um filme que era reutilizado na boca de vários pacientes, após ser lavado apenas, e mostrava uma radiografia qualquer revelada. O paciente, por ser leigo, não sabia que aquela radiografia não era sua e ainda pagava pelo raio X.” Isso não é gambiarra. Isso é estelionato. Gambiarras compreendem usar um instrumento que não é para determinado fim porque o instrumento correto caiu no chão, por exemplo, quando você não tem outro sobressalente e precisa finalizar o trabalho.
A busca pela excelência
Sobretudo, depois de algum tempo trabalhando meio no “modo automático” e focando muito na quantidade e não na qualidade, a gente precisa parar para pensar. Refletir. “Eu trabalho assim, mas não aprendi assim”. “É isso que eu quero para minha vida profissional?” Há algumas semanas tive uma discussão em comentários na Internet, quando postei sobre a importância da sonda periodontal. Entretanto, dois dentistas vieram defender com unhas e dentes o uso de uma “sonda normal” com ponta para sondar bolsas periodontais. Escreveram que eu não poderia julgar a eficiência dos outros baseado no instrumental utilizado. Em outras palavras, seria o equivalente a médicos defenderem a realização de cirurgias cardíacas utilizando facas de churrasco.
Veja a discussão à seguir, quando eu postei que “a sonda Periodontal era um instrumento fundamental para se ter no exame clínico. Quem não tem está por fora!”
Na minha singela opinião, quem não tem competência que não se estabeleça, segundo o ditado popular. Atualmente penso assim. Obviamente, que na sociedade “mimimi” de hoje que prega que devemos aceitar tudo e ter a cabeça aberta, isso não serve para qualidade em nenhum serviço. Eu já cansei de ter que defender o óbvio. A não ser que você esteja praticando Odontologia no meio do mato, sem uma tomada e sem recursos tecnológicos, aí você se vira com o que tem.
Por outro lado, se você tem um consultório ou clínica em qualquer cidade e você pratica gambiarras como regras e não está se esforçando para evoluir, acho que você vai se contentar em ser sempre um profissional medíocre. Um dentista nota 5,0. Isso entra também naquela história de valorizar a profissão e se valorizar.
Aí depois, fica bravinho com vídeos de humoristas tirando sarro de dentistas, mas vive fazendo gambiarras. O humorista está no papel dele. E o dentista?
Um dos conceitos muito difundidos de excelência hoje vem de uma frase do Professor Mario Sergio Cortella “Faça o teu melhor, na condição que você tem, enquanto não tem condições melhores, para fazer melhor ainda.” Contudo, a gente PRECISA SEMPRE estar em busca de melhores condições. Como dizia minha querida chefe no Pronto Socorro Odontológico da APCD, Dra. Tânia, lá no meu início de carreira: “seja você a mudança de paradigma dentro do seu trabalho”. Você não vai conseguir melhorar o seu local de trabalho de uma vez, mas pode tentando convencer o dono da clínica sobre uso de materiais melhores, sobre melhorias na biossegurança, sobre um fluxo melhor com os pacientes.
Então, a ideia é ser cada dia melhor. Aumentar a eficiência dos procedimentos e o conforto dos pacientes. Concluindo, esse é um dos caminhos para estar sempre melhorando, aumentando a experiência e utilizando bons materiais. Concorda? Deixe seu comentário abaixo!
Um abraço,
Luiz Rodolfo
Equipe Dicas Odonto